Blog

Os "sotaques" da Libras"
01 de dezembro de 2025
Os "sotaques" da Libras"

Como uma língua viva, a Libras está presente nas mais diversas regiões do Brasil, do Oiapoque ao Chuí, e nas mais diversas situações: desde conversas informais a defesas de doutorado e pronunciamentos oficiais do governo federal. Mas em um país tão grande como o nosso, com culturas e povos tão distintos uns dos outros, é de se esperar que a Libras não seja “a mesma” em todos os lugares onde é usada. Isso ocorre por uma série de fatores socioculturais e, a esse fenômeno, damos o nome de variação linguística.

A variação linguística ocorre, basicamente, da seguinte forma: a língua é viva e dinâmica, ou seja, está em constante transformação – tanto histórica quanto situacional – e evolução. Dessa forma, podemos pensar que a Língua Portuguesa do início do século XX não é a mesma que falamos hoje, certo? Embora se trate da mesma língua, seus usos, seu léxico e suas estruturas são diferentes. Isso porque o contexto histórico e sociocultural dos falantes – nesse caso, os brasileiros – era muito distinto do que se tem hoje. As redes sociais ainda não existiam, assim como a própria internet. Os aparelhos digitais ainda eram um sonho distante e mesmo no cenário político, as coisas não se pareciam muito com o que temos nos dias atuais.

No caso da Libras, algo semelhante acontece. Os surdos não tinham uma larga participação social nesse período e o próprio Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES) ainda era recente no início do século XX, tendo sido fundado em 1857, no Rio de Janeiro. Assim, a Libras estava evoluindo aos poucos, mas, em termos nacionais, ainda não se pensava ter a presença da comunidade surda – o que inclui também os intérpretes e professores de Libras – na sociedade e não havia muitas políticas públicas de incentivo às minorias sociais até então.

Com o avançar dos anos, as mudanças sociais se intensificaram, de modo que a comunidade surda também foi afetada, passando a adentrar mais espaços, sobretudo no âmbito da educação, o que também aumentou a visibilidade dos intérpretes de Libras. Já no século XXI, a criação de leis e de políticas públicas específicas para as pessoas com surdez e para os profissionais a elas associados possibilitou o avanço da comunidade e uma representação mais significativa socialmente. Com isso, a Libras expandiu-se em vocabulário, estruturas e pesquisas, tornando-se mais complexa e difundida no território nacional.

Compreender esse contexto é importante porque, a partir da difusão da língua e do aumento no número de pesquisas e estudos realizados com surdos e com a Libras, foi possível perceber variações entre os diversos grupos usuários do sistema linguístico.
A variação ocorre em nível interno e externo à língua. Em outras palavras, aspectos como gênero, idade, região geográfica e condição socioeconômica podem influenciar na variação tanto quanto questões relativas à fonética, à fonologia e aos demais níveis linguísticos que compõem a Libras.

Para citar alguns exemplos, é perceptível que existe uma diferença entre as sinalizações realizadas por falantes do gênero masculino e falantes do gênero feminino. Empiricamente, as mulheres parecem delinear melhor os sinais e utilizar o espaço de sinalização de maneira mais restrita, ao passo que os homens tendem a serem mais “expansivos” e menos cuidadosos quanto aos detalhes fonético-fonológicos dos sinais. Já no que concerne às questões linguísticas, podemos pensar em sinais distintos para um mesmo referente – normalmente associados à região geográfica na qual os falantes habitam e à cultura a que pertencem – como no sinal REFRIGERANTE, que é realizado em São Luís com a mão passando pela testa em movimento semicircular e fechamento consecutivo dos dedos, tendo a palma da mão direcionada para baixo; e em São Paulo com uma mão configurada no formato do dedo indicador distendido, a outra mão configurada em “5” e um movimento semicircular para cima, simulando a retirada da tampa da garrafa com um abridor.

Através desses exemplos, é possível identificar a influência de fatores internos (estruturas linguísticas) e externos (aspectos socioculturais) no uso da Libras a nível local e nacional. Essas variações podem ser mais sutis, como nos dois sinais utilizados para AMARELO, em que o movimento sofre uma alteração mínima de um para o outro, ou mais aprofundadas, como no exemplo acima, do sinal de REFRIGERANTE.

Compreender a variação, suas nuances e processos, é a chave para banir do nosso comportamento atitudes discriminatórias em relação a diferentes falantes – o preconceito linguístico – bem como para expandir nossos conhecimentos e horizontes linguísticos e culturais. Além disso, o que é encarado como variação linguística hoje pode ser uma mudança linguística no futuro, mas isso é algo para ser abordado em outro texto.

Aqui na Moreno Libras, nos preocupamos em ofertar uma educação de qualidade que perpassa não somente pelos aspectos estruturais e conceituais, mas incorpora os estudos variacionistas como um dos pilares linguísticos para o aprendizado efetivo da Libras. Buscamos formar nossos alunos como falantes conscientes de seu papel social a partir da variedade que utilizam e respeitosos com outras variedades existentes.

Se você deseja transformar sua vida, se profissionalizar ou aprender a se comunicar sem barreiras, conheça nossa escola e se deslumbre com as possibilidades que a língua de sinais oferece!

Receba nosso conteúdo

Cadastre-se para receber os nossos conteúdos e novidades.